29.9.09

Das obviedades

Perder o emprego nunca matou ninguém. Morre-se por não achar um.

15.9.09

Morte

Estes tempos de pandemia, gripe etc. tornaram a gente um pouco mais neuróticos. É todo mundo lavando a mãozinha, passando álcool, lendo precauções – que morrer ninguém quer. Ficam duas semanas sem aparecer nas escolas, preservando a vida, e mal as coisas se equilibram, vai todo mundo gastar essa mesma vida em inúmeros sábados de trabalho repositivo e sei lá quantas mais horas ordinárias na linha de produção, cujo limite único são as vinte e quatro horas do dia.

Hoje, senti-me meio mal, nariz escorrendo, enjoo-quase-vômito, febrinha... é a tal gripe, pensei. Vou para casa. E abandonei uma aula de política pela metade, precisava descansar, o corpo doía. Daí, fico até agora pensando no ridículo que é pensar em morrer. Mas gosto da brincadeira, e como também sinto medo, vou brincando a sério, já me convenço de que não passo de amanhã, morte vindo a cavalo, e já que é assim, passo uma última vez pelo supermercado, faço bem em me preparar; se o consumismo é um mal, também sei que pecado não é, e nem compro muita coisa, só o bastante para um moribundo de hábitos simples. É, por exemplo, pegar somente um suco preferido, que é de manga, uma fruta boa com gosto de coisa antiga, que é maçã, e afinal uma bolacha, uns pães, uma escova de dentes. Este último item é que não se explica muito bem, afinal, a escova que tinha em casa estava lá com algumas cerdas meio espandongadas, é verdade, mas se estava só meio ruim, também estava obrigatoriamente meio boa – aguentaria ainda alguns dias, sem contar que morimbundos não costumam enxergar muito longe, nem chegam a pensar em dias, pensam quando muito em minutos, sendo na maior parte das vezes um "ajeite aqui este travesseiro, que me incomoda", "dê-me ali aquele remédio, que me dói", "não me venham com jazigo feio".

E fico assim perdido com a escova na mão, frente à gôndola, que fornece escovas de todos os tipos e bolsos, para tornar os dentes mais brancos e lisos, e talvez ignore que a terra de onde vêm seus componentes não faz questão de dentes fortes ou cariados, devora-os a todos com a mesma voracidade, sem distinção de cor ou tecnologia. Resolvo pela mais barata, não há cerda que não limpe nem se estrague. Saio, chego na casa vazia, sinto-me só, e desgraçadamente feliz. Talvez devesse pensar mais em morte, sem precisão de noticiários.

8.9.09

7 de setembro

Também não fui desfilar ontem. Dia ensolarado, hino nacional, bandas e fanfarras, escolinhas, aluninhos, prefeitinho acenando para o séquito de funcionários públicos que anualmente lhe vão pedir a bênção. A cama preguiçosa e quente finalmente disse um "Fique" mais alto. "Está bem", concordei, vencido e vitorioso.

Não há nada mais estúpido que uma Pátria – esta perigosa abstração. Deveria haver o dia de queimar bandeiras, cuspir em brasões, parodiar o hino, riscar o mapa, abraçar uruguaios, argentinos, paraguaios, bolivianos etc. etc. e saber que, concretamente, não existe nada além de humanidade. E que triste seria um 4 de julho por aqui... Pior que ter uma mentira, é ter uma mentira que deu certo. E mesmo não tendo uma nação que funcione, cá pra nós, dos substantivos abstratos, "país" é o mais concreto. É comum ouvir gente dizer que Stálin foi pior que Hitler, afinal, o alemão matou judeus estrangeiros, enquanto o russo, aaahhh, o cara matou gente de seu próprio país! De longe, a ideia de país, se não for a mais perigosa, é a mais mentirosa das invenções.

Vanusa, v. é linda.