6.12.11

...quem precisa de inimigos?

Não tenho nada contra meu mundo. Tenho até muitos amigos e, por ignorar deles qual seja o grande ou o melhor, corro o risco de não ter amigo algum. Contudo, minha companheira me acompanha e me ajuda, sobretudo quando desanimo e caio; sinto que somos grandes amigos. Mas isto se poderia dizer trata-se de amizade especial ou, até, vulgar, uma vez generalizado o casamento. Mas as pessoas me ajudam, às vezes retribuo um sorriso e, descartado o que há de ruim, mais as relações sociais etc. - toda vez que aprendo, ou amo, ou me embriago, sinto orgulho da espécie.

Com os avanços medicinais, incrementos de higiene, dietas de proteína, crescimento do mercado interno, lulismo e aumento na longevidade do brasileiro -, a única coisa que incomoda é ter tudo isso pra viver e todo esse trabalho em ficar vivo; e tão pouco tempo para desfrutar disso, deles, dela. Porque, ainda que eu trabalhe menos, e sempre mais, para escândalo de minhas colegas de trabalho - que temem ver-me reduzido à penúria -, não obrigo nem posso orientar meus amigos a semelhante resolução. Não me admira fracassar nesta empresa megalomaníaca.

O que me admira e constrange e deprime é sequer convencê-los de que não é saudável trabalhar em mais de um lugar, todos os dias, sacrificando em nome do transporte seu horário de almoço. Se é que é saudável falar quando se come, mesmo aí a reunião é prejudicada - e tanto pior pra mim, que, versado só em letras, tinha muito a dividir com um amigo matemático. Mas hoje ele não pode comer. É preciso correr. E se, no trânsito, outro vem e pára, e bebe comigo após tanto tempo, e me diz que devo desistir do homem, que o egoísmo é inato, que a natureza humana é imutável - eu não tenho nada a dizer. Seria inútil reviver a poesia de John Donne, já lembrada pelo Hemingway: no man is an island. Porque vamos mesmo sendo ilhas - no salgado oceano do trabalho, do consumo e da desilusão.

O que não me impede de gritar, emputecido e gasto, que se roubam meus amigos, sou duplamente agredido e náufrago; que a miséria deles é a minha miséria elevada à constelação das potências.

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