Hoje (ou ontem) a tevê passou o Munique, do Spielberg. Bom filme. Que deixou mais uma dúvida: que é um terrorista? O terrorista faz o mal ou um mal? Porque um terrorista pode parecer um insensível (porque mata ou se mata sem culpa nem reflexão) apenas quando esquecemos que nós vamos vivendo nossas vidas normalmente, em nossas casas, em nossos trabalhos, em nosso lazer, sem muita culpa nem muito o que pensar sobre a fome de milhões de pessoas, dentre as quais estão seres humanos comendo depois de porcos – uma cena do Ilha das Flores que já não sensibiliza mais ninguém: todo mundo é uma ilha, a milhas e milhas e milhas de qualquer lugar. Nesta terra de gigantes, que não só trocam vidas por diamantes, como também julgam ser a imaginação, a curiosidade e as Viagens de Gulliver coisa para gente pequena, que ainda não tem muito que fazer da vida.
Isso vai se estender para outras coisas. Que é fazer o bem? O ruim dessas coisas peremptórias é que elas só existem se existirem algo contrário (o que torna tudo assustador, parece mesmo que andamos em código binário); de modo que, parece, só se pode dizer que alguém faz o bem, quando sabemos o seu contrário, isto é, quando alguém faz o mal. Se um cara que detona explosivos faz o mal, precisamos pensar no que é fazer o bem. É simplesmente não detonar explosivos? Parece tudo simples demais. Nomes simples para uma realidade complexa. Mas talvez Heráclito não estivesse errado; talvez tudo o que existe tenha mesmo o seu contrário. A questão é que seu pensamento não pode ser mutilado, afinal, disse ele também que tudo está em movimento. E, muitas vezes, o contrário não se enxerga ao longo do espaço, mas no decorrer do tempo. De fato, luz e sombra coexistem no espaço; não no tempo.
É possível, e isto por enquanto é só hipótese, que o 11 de setembro venha a ser visto no futuro não como obra de gente insana e terrorista. Talvez este número nem tenha tanta importância perto de outros números piores, ainda mais desumanos e pelos quais, direta ou indiretamente, todos nós somos responsáveis. É preciso pensar sempre nas causas e nas consequências dos nossos atos – e não o fazemos. Não por nossa culpa, talvez; nem a escola nos ensinou assim, nem o trabalho nos permite hoje. Mas, afinal, de quem é a culpa dos atentados terroristas? Apenas daqueles que detonam bombas ou também se estende aos que as fabricam e vendem? Há uma fábrica da CBC ao lado da minha casa, na divisa entre Mauá e Ribeirão Pires; será que sabem para onde vão suas balas?
Sempre poderão dizer que não dá para saber ao certo para qual fim serão usadas as armas ou as bombas que produzimos. Ou então poderão dizer que numa arma produzida ou vendida não há mal nem bem – só se poderá conhecer isso com seu uso. O que não se poderá dizer nunca – e que, de fato, nunca dirão – é que muitas vezes preferimos não saber nem conhecer nada. Da mesma forma, é aceitável que não se veja as relações entre as coisas; mas ignorar que elas existam, e, mais, que se dividem em diretas e indiretas, isso é que é inaceitável.
2 comments:
Gostei muito do seu post de hoje, e digo mais é material pra ser levado pra sala de aula! discutido ou analisado pelos seus alunos!... As palavras tem poder por mais que o mundo queira nos mostrar que não... Na parte do "cada homem é uma ilha" não pude deixar de me lembrar no "Conta da Ilha Desconhecida" de José Saramago.
abraços.
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