Acordei sem sono, eram duas da manhã. Tinha ido dormir cedo, mas nunca tenho muito tempo para dormir, e continuei de olhos fechados, insistente até quando não deu. Quando os abri, vi pelo vidro o balançar dos galhos mais altos de um árvore cuja espécie não sei, tem uns 70 metros de altura, e o vento faz barulho ao mover cada folha de sua copa. Devo morar perto de área de mananciais. E fiquei me perguntando por que não dormia, em vez de constatações inúteis e perigosamente bichogrilosas. Mas logo vi que o céu estava estranhamente claro, coisa rara na cidade, lembrava-me os céus da infância, claros, estrelados, alumiados da lua, tão perto agora. Era um céu escandalosamente decifrável, apesar das nuvens, via-se tudo pela janela. Havia a lâmpada de 500 watts fora do prédio, mas só ela não faria tanto. Distingui vida em cada caule de árvores, vi o branco da nuvem, o azul enegrecido do céu de espaço a espaço. Era um milagre. Abri a janela e percorri o olhar pelo espaço a procura do disco voador, mas não vi nenhum. Só ouvi os metais dos grilos, a sinfonia dos sapos, cães viralatas latiam de tempo em tempo. No mais, o silêncio. Grande. E quis pôr tudo abaixo. Se tivesse o poder de Pyongyang teria mandado tudo pelos ares, detonaria não só minhas ogivas nucleares, mas também as adversárias. Por um momento achei que o planeta viveria melhor sem os humanos.
Mas logo me interrompi. Que pensará o planeta sobre melhor e pior? Que é, de fato, a paz, a tranquilidade e o silêncio das duas da madrugada depois que o último ser humano dorme? Que é vida? Nada, quando tudo dorme. Nada tem importância, senão para nós mesmos acordados. A medida do tempo, a transparência dos cristais, os nomes da fauna e da flora, as medidas do espaço, a demarcação das áreas, as fases da vida, a memória, o homem na lua, a eletricidade, as cores, a aerodinâmica das naves espaciais, a constituição carbônica dos alienígenas, a diplomacia, a bomba atômica, o poder, a verdade. Tudo, absolutamente tudo, das estrelas aos micróbios – é algo que jamais saberemos. Porque toda vez que olhamos estrelas e micróbios não estamos vendo nada além de nós mesmos. O mundo tal qual é deixará de ser nos primeiros movimentos do cosmos, da physis, do universo – sem os homens.
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