3.7.10

Vale (do Rio Doce)

O sudeste do Canadá, próximo à fronteira com os EUA, vive uma situação inusitada: trabalhadores do primeiro mundo em greve contra uma poderosa multinacional... brasileira. Há já bastante tempo.

A Vale vive o drama de toda empresa. Para fazer dinheiro, precisa que alguém entre chão adentro e de lá retire o níquel, que ela, Vale, vende lucrativamente a metalúrgicas fabricantes de anticorrosivos para aço, como ela mesma diz. O mesmo para o ouro, dos circuitos de computador; a prata, das velas de ignição; o cobre, dos fios elétricos; o basalto, dos trilhos ferroviários; o cobalto, nas baterias de lítio; o paládio, das obturações dentárias; o rutênio, dos chips eletrônicos; o ródio, dos conectores elétricos; o irídio, das agulhas de injeção – para acumular capital, precisa sempre alguém que trabalhe.

Em março, o Estadão informava que:

A Vale Inco, uma subsidiária da Vale, vai contratar trabalhadores terceirizados para contornar o problema dos funcionários em greve da companhia enquanto reinicia as atividades de mineração de níquel em Ontário, no Canadá, disse Cory McPhee, porta-voz da empresa.

Engraçado o jornal mencionar que a Vale tem um "problema" com a força de trabalho, tão necessária à sua acumulação de lucros, e esquecer os "problemas" enfrentados pelos mineiros que, logo após a Vale adquirir a canadense Inco (a compra ocorreu em 2006), viram mudar seus planos de aposentadoria e um bônus salarial, agora rebaixado, medida justificada pela queda nos preços do níquel. Mais à frente, o jornal deixa a entender que o sindicato exige demais. Mas, em algum vermelho lugar, questionaram: 

"Digo que, se eles têm alguma dúvida se eu mereço o meu salário, é só entrarem debaixo da terra para verem como o trabalho é duro e perigoso."

Hoje, a Folha noticiou que a greve fez um ano. E mais: 

Tudo indica que um acordo está próximo, mas não apagará os problemas dos últimos meses, quando a cidade de 150 mil habitantes, a 380 km de Toronto, viu episódios de violência e processos judiciais mútuos que transformaram a empresa em símbolo local de "ganância corporativa".

Embora o teor desta reportagem da Folha seja menos parcial na cobertura, toda vez que conflitos de classe aparecem, no geral a imprensa mostra o que ela é: classista. Na verdade, está cada vez mais difícil sustentar o mito de uma pátria, para qualquer das classes em disputa, sejam trabalhadores ou empresários. Isto na prática. No plano das ideias, segue a mesma xenofobia de sempre. Por aí, disseram que:

Pessoas que conhecem bem a situação disseram que o estilo hierárquico de administração da Vale entrou em choque com a abordagem mais consensual da Inco, enquanto a inesperada compra encontrou resistência e ressentimento por parte da indústria canadense, mais acostumada a adquirir mineradoras brasileiras.

Já há muito o pensamento socialista, seja ele anarquista ou comunista, havia percebido o non-sense de assalariados se aferrarem a ideia de pátria. As multinacionais já sabem muito bem disso. A imprensa vai aprendendo. Os governos são uma contradição, ora indo na contramão da história, ora forçados a seguir com ela, muito a contragosto e com todos os sacrifícios, como faz agora a Grécia, e como logo farão Portugal, Espanha, Alemanha e EUA. Vai devagar, mas a tendência é que, mais cedo ou mais tarde, todo mundo perceba a mesma coisa: a aldeia global continua dividida em classes.

No comments: