O tema da CBC reapareceu tempos atrás quando um amigo curiosamente revelou-me que havia ficado apenas três meses nela. Que, enquanto fabricava balas, pensava "quem será morto por isso?". Está certo que, dentre os motivos de sua saída, pesou muito mais o fato de que seu salário era mais baixo do que o costume. E, também, teve aquela vez que uma bala explodiu, e a pólvora lhe chamuscou superficialmente o braço e parte do rosto. Nada grave. Mas esta preocupação – com o outro, com o efeito das nossas ações, com as coisas que fazemos –, ainda que tendo menos peso em sua decisão de sair da fábrica, ainda que em alguma pequena medida e em algum pouco grau, ainda assim, tudo compôs as linhas corretas e dignas do empregado que, ao ser comunicado de sua renovação de contrato, de sua aprovação no período de experiência, bartlebyanamente responde:
– Não.
– Como não? – interroga o encarregado, momentaneamente atrapalhado.
– Eu prefiro não.
– Como não?
– É que enquanto vocês me avaliavam, nestes três meses também avaliava a empresa. O caso é que vocês não passaram na experiência.
Surpreendido, o chefe olhava o papel que o empregado deveria assinar.
– Mas e o quê que eu faço com esse papel agora?
– Ora! É só escrever aí que não quero...
– Tá, mas...
(O encarregado mal sabia escrever.)
– Assim: "O funcionário não quer assinar, porque decidiu não renovar o contrato." etc. etc.
A hierarquia se invertia: surpreendido pela inversão esdrúxula, o encarregado atentamente escrevia o que o subordinado lhe ditava. Ninguém nunca tinha visto aquilo.
Estas coisas novas, inteiramente novas, que extrapolam as receitas e os costumes, que não obstante têm uma função prática, e que são reais, e apesar de reais, e mesmo reais, também deveriam ser chamadas de "arte". Uma arte superior. Que se consome enquanto se cria.
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